06/02/2020

RAÍZES DO MEDO - Para além da dialética em sentido a priori, situa-se o império dos medos. Visto que estes resultam da consciência culpada é contra ela a intestina luta anímica.


Império dos Medos
“Porque Deus não nos deu o espírito de temor, mas de fortaleza, amor e moderação”.2 Timóteo 1:7
Seguir o caminho das virtudes e boa reputação, tem preço e consequência em um mundo moralmente falido e de igual forma, a prosperidade. Haja vista, a questão do medo com o qual se debatia o homem próspero do Oriente. Acerca desse mal, está escrito: “... aquilo que temia me sobreveio; e o que receava me aconteceu.” (Jó 3:25). Todo o medo tem origem, consciente ou “não”, pois, como dizia Parménides, o pré-socrático: “Nada pode surgir do nada.

Portanto, o temor do homem em questão não era infundado, tratava-se de algo consciente, existente. Isso fica claro no versículo, que enfatiza: “Nunca estive tranquilo, nem sosseguei, tampouco repousei, mas veio sobre mim a perturbação.” (Jó 3:26) Depreende-se aqui, que Jó debatia-se com algo real, previsível, que lhe deixava perplexo. Saltando sobre as minudências dessa inquietação, lembremos que a Bíblia diz: “o efeito da justiça será paz, e a operação da justiça, repouso e segurança para sempre.” (Isaías 32:17) pelo que se pode inferir que o homem ímpar do Oriente, temia a injustiça devido à inversão de valores.

Jó era temente a Deus, porém, não o conhecia conforme a confissão: “Eu te conhecia só de ouvir falar, mas, agora te veem meus olhos” (Jó 42;6) Deus honrava essa fé, entretanto, permitiu que fosse testada para, leva-lo a depender única e exclusivamente d'Ele. A fé necessita da têmpera das provações, para que seja inabalável. Apesar da assertiva: “em tudo isso não pecou Jó, nem atribuiu a Deus falta alguma” (Jó 1;22 e 2;10), ao assalto da adversidade seu castelo desmoronou e afloraram sinistros instintos. Então abrindo a boca amaldiçoou o dia de seu nascimento (Jó 3;1ss). Após avalanche de indignação que vai do capitulo 3 ao 37, reconhece a própria culpa e confessa: “Por isso me abomino e me arrependo no pó e na cinza.” (Jó 42;6)

Deste contexto conclui-se que ter conhecimento, acerca de Deus é diametralmente oposto à relação (comunhão) com sua pessoa. Qualquer que se enquadre neste perfil corre risco de endeusar sua fama, reputação e sentir-se orgulhoso do “status”, entretanto, visto ser este um mecanismo de autoafirmação e justificação dará ocasião a um medo sepulcral, devido o culto da "divindade" morta criada à imagem humana. Afinal, onde há morte paira tenebroso terror.

Provérbios 26;2 diz: “... a maldição sem causa não virá”. De igual forma o medo tem sua origem. Adão alegou temer o fato de estar “nu”, entretanto, saltou sobre a consciência de sua transgressão. Destarte, o que realmente temia, situava-se para além das palavras, que eram mecanismo de defesa; misero atestado de pobreza e desfaçatez. Existe uma máxima que afirma: “Temer o mal é ocasioná-lo.” Entretanto, não é o temor que ocasiona o mal, mas, a existência deste na alma gera perplexidade. Uma análise coerente com os fatos envolvendo a vida de Jó permite contestar a ideia que os flagelos são consequência do medo, antes, resultam da consciência do próprio flagelo.

A calamidade de Jó, não sobreveio porque temia. Seu medo era consequência do conhecimento a priori, do que podia acontecer, bem como, de sua convicção empírica, do preço da boa reputação num mundo diabólico. Enfim, a casuística do medo está relacionada à consciência, da verdade, da realidade; de conhecer o bem e o mal, sem ter poder de resistir a este, tampouco virtude para praticar aquele.  É com este “fantasma” que a alma se debate. Ciente desta realidade, o apóstolo faz a lúgubre constatação: “Miserável homem que sou! Quem me livrará do corpo desta morte?” (Romanos 7:24)

O Senhor Jesus, teve medo, de ir para cruz. Porém, esta não veio por causa do medo, mas, este por causa da cruz. A transgressão de Adão não resultou do medo, mas, este da transgressão. O medo de Elias não era da fúria de Jezabel, mas, da consciência de ter cruzado os limites do oficio, passando de profeta a carrasco e vingador na chacina dos profetas de Baal. Não é pelo fato de temermos a morte que morremos, porém, o que tememos é sua consciência e realidade, e não queremos conviver com ela, pois, está associada à culpa e juízo divino ou seja, a causa primeira do medo que está relacionada à consciência, à verdade, a DEUS.

O contexto informa que Jó oferecia holocausto porque temia por seus filhos, dos quais tinha consciência que eram blasfemos (Jó 1;5) Ademais, encontramos duas vezes Deus proibindo o inimigo de tocar na vida de seu servo, porém, acerca dos filhos, nenhuma recomendação; paira um silente hiato. Na contramão de certos ensinos psicológicos, a Bíblia enfatiza que: “o temor traz consigo a pena e o que teme, não é perfeito em amor” (1ª João 4;18) Portanto, não era de pânico – o terror de Pã – que Adão fugia porém, da consciência de sua transgressão. O fantasma, não era determinista e sim, de um atentado premeditado, de uma escolha infeliz.

Todo ser humano teme a morte porque sabe que estará nu diante do grande trono, e não terá como esconder aquilo que verdadeiramente é. Se de fato tenho certeza que Deus está no controle de tudo, não tenho razão para temer e mesmo que o medo assalte, é possível superá-lo encorajado na confiança d’Aquele que nos conduz. O Senhor Jesus temeu, entretanto, não desistiu da cruz, pois, colocou acima do medo, a submissão à vontade de Deus e venceu na condição de homem, o maior dos medos; A MORTE.

Na verdade, todo ser humano teme a consciência, e trava uma luta ingente, para dela se livrar, portanto, este paradoxo edipiano deixa claro que a luta anímica é contra a bem-aventurança (felicidade), na ânsia de ser feliz, a exemplo de Édipo o rei que na tentativa de fugir à desgraça acaba indo ao seu encontro, não por fatalidade, mas, por recusa à verdade, realidade, consciência e a DEUS.

Destarte, é possível vislumbrar, em parte o desabafo de Jó: “...aquilo que eu temia me sobreveio, e o que receava me aconteceu” nesta linha de pensamento diz um provérbio: “Quem teme ser vencido tem a certeza da derrota.”
Concluindo, quando a Bíblia enfatiza: “não temais” quer simplesmente dizer não recue, mas, avance contra o medo escudado no Senhor, e triunfará sobre ele: “Porque Deus não nos deu o espírito de temor, mas de fortaleza, e de amor, e de moderação” (2 Timóteo 1:7).


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